Wednesday, December 26, 2007

Indagações de fim de ano

Que fascínio é este que Sergiu Celibidache exerce sobre os meus sentidos?
Existe música para além de Johann Sebastian Bach?
De que mais preciso além da música para manter vivo o meu núcleo acumbente?

Wednesday, October 31, 2007

Lispector


Liberdade é pouco. O que desejo ainda não tem nome.


(de Perto do Coração Selvagem)

De mãe para filha


Quero que a minha filha se cuide,
porque o tempo passou e dela não posso mais cuidar.
Nos limites de minha consciência, fiz o que pude.
Hoje, fica um certo sentimento de culpa pelo que não fiz.
Por ter deixado de aprofundar reflexões sobre o que era ser mãe.
Mas hoje também sou grata a mim.
Sim, pensando em meus filhos, devo ser grata às minhas tentativas e às minhas intuições.
Devo ser grata pelo que (me) corrigi, pelo que (me) “eduquei” e por algum bom exemplo que possa ter deixado.
Por meus filhos, sou grata pelo que me cuidei.
Grata por ainda estar aqui e ter em minha história de vida a vida de meus filhos incluída.
Por ter em minha saúde, a saúde de meus filhos incluída.
Deste inusitado pensamento rascunhado em meio ao caminho de ida ao trabalho, devo concluir: toda mãe deve cuidar bem de si. Eis um jeito seguro de também cuidar de sua amada cria.

Comba
Lavradio, em 22 de agosto de 2007

Sunday, June 03, 2007

Morte no sábado

- Vê a senhora o prédio ali adiante, onde há aquelas luzes mais fortes? Uma mulher se jogou lá do alto, faz pouco ... Lá vai saindo a ambulância.
- Morreu?
- O que a senhora acha? Jogou-se do 901!
- Que horror!
A mulher se jogou do nono andar ou foi jogada? A resposta fica para a polícia que até mais tarde, quando voltei para casa, ainda mantinha uma patrulha em frente ao prédio.
Noite feia de sábado, ocasião propícia para o desespero dos deprimidos, pensei - dos oprimidos, como digitei por equívoco ou ato falho. Afinal, a depressão deve oprimir, senão o peito, a alma, o desejo de estar com, o mais remoto sentimento de leveza de ser.
O fato ficou ali sepultado no silêncio da noite de um jeito ainda mais banal que o de costume. Seja porque caia uma chuva fria e insistente. Seja porque a rua permanecia em sua calma habitual, talvez só um pouco mais triste. Seja porque não havia gente aglomerada a espiar e esquecer a própria desgraça diante da desdita alheia. Seja porque a dor do suicida se esvai no gesto e não desperta dó, só perplexidade. Seja porque não faz muita diferença estar desperta na noite escura ou estar adormecida no vôo sem paradeiro, ns brumas da eternidade.

Wednesday, April 11, 2007

...por isso blogo

Escrevo pra me aquecer, pra me esquecer, pra não morrer.
Escrevo porque a palavra escrita me excita, me deixa aflita, mas sem sofrer.
A palavra me faz perder o sono e me lança em insanas aventuras do existir.
Blogo porque a palavra é o meu devir.

Wednesday, April 04, 2007

Mora na filosofia

De autoria de uma pequena de três anos, inventendo música ao acordar:

"Eu sou você de mau jeito."
(em 03/04/2007)

Sunday, March 25, 2007

Evolução (Mario Quintana)

O que me impressiona, à vista de um macaco, não é que ele tenha sido nosso passado: é este pressentimento de que ele venha a ser nosso futuro.

Friday, March 23, 2007

lição para todo dia

De repente, escuto no ônibus uma conversa de adolescentes. Elogiam as coisas boas do colégio. E uma menina comenta com a outra os cartazes colocados na escada: "mantenha o foco."
A conversa dos meninos passou por mim como uma lufada de vento. Mas o conselho, "mantenha o foco", me ficou na mente, como se a frase tivesse sido dita exatamente para que eu a ouvisse.
Alguns dias depois, uma amiga manda pela internet um teste de personalidade de orientação yunguiana. Resultado do meu perfil: ENPF - extroversão, intuição, feeling, percepção. Ao fim, uma sugestão de oração: "Senhor, ajude-me a ter mais foco - veja, um passarinho! - nas coisas que eu faço."

Friday, March 09, 2007

8 de março

De manhã, lamentei meu distanciamento das ações feministas e tratei com o marido assuntos da Fazenda familiar.
No meio da tarde, enquanto comprava um presente para minha empregada, contei às vendedoras sobre minha participação no movimento.
- Éramos um pequeno grupo e, mesmo assim, inscrevemos o feminismo na história do povo carioca.
- Ah...Viu só? - disse uma moça para a outra.
De volta ao Flamengo, no ônibus, carregada de bugigangas da Casa e Vídeo, observei com certa inveja uma velha prostituta que passeava na Praça do Lido, levando uma rosa vermelha magricela recebida no caixa da padaria... Homenagem pelo Dia Comercial da Mulher, ops! pelo Dia Internacional da Mulher.

Friday, March 02, 2007

"Cheiros Nus"


senta aqui do meu lado.
pega um copo, gelo,
o uísque está na mesa.
bem...
agora faz um instantinho de silêncio:
deixa sair esse ranço de cidade,
sociedade, compromissos.
um instante só e a bruma deixa teus olhos.
olha agora comigo,
ouve comigo,
percebe esse nada?
esse silêncio,
esse vento mudo e triste?
olha aquela árvore grande e escura
quieta no vale perto das pedras.
sente a calma de tudo,
vê o grande, o largo,
não diz nada nem deixa que eu fale.
vê apenas. ouve e sente.
percebe na pele a vida em volta.

o cheiro...
sente o cheiro desses cheiros todos,
desses verdes todos,
de tua vida toda.
acende um cigarro:
repara que nem a fumaça tem pressa
e o bonito não fala, se mostra apenas.
agora, bem devagarinho
tira teu coração do peito
e mostra isso tudo a ele.

(Emanuel Côrtes)

Thursday, January 18, 2007

Meus mares

Ultimamente tem sido assim: basta sentir o cheiro bom da maresia para que eu tenha satisfeito o meu desejo de mar. Não é mais necessário o toque dos pés na areia. Não mais faz falta a alegria de andar decidida em direção ao mergulho. Nem o sal, o sabor do sal a temperar a pele também já não é mais apelo para banho de mar. E aquela cor de bronze fruto de manhãs azuis de praia? Não mais resultaria em beleza. Hoje, me apego à maresia. Não por saudosismo. Mas porque o mar em minha vida é agora quase uma abstração, mera referência poética. Então, se não mais vou ao mar - porque não vou mesmo -, o seu perfume a mim vem e me reporta à sensorial lembrança de nosso convívio. Ergo um altar ornado de algas, conchas, búzios e flores. Queimo incensos de maresia e me transporto às improváveis vivências em mares atlânticos, mediterrâneos, mares de jangadas, de titaniques, mares tantos encantados e distantes de mim.